Decisão da juíza DANIELA BARBOSA ASSUMPÇÃO DE SOUZA que pede o bloqueio do
Veja a seguir a decisão que pede o bloqueio do WhatsApp no Brasil nesta terça-feira (19).
"PODER JUDICIÁRIO
DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
2ª VARA CRIMINAL
DA COMARCA DE DUQUE DE CAXIAS
2ª VARA CRIMINAL
DA COMARCA DE DUQUE DE CAXIAS
IP 062-00164/2016
D E C I S Ã O
Trata-se de representação da d. autoridade policial da 62ª DP,
ratificada pelo Ministério Público, dando conta de que a determinação
deste Juízo para a interceptação telemática das mensagens compartilhadas
no aplicativo Whatsapp, pertencente ao Facebook Serviços Online do
Brasil, não foi cumprida, requerendo, assim, as medidas legais cabíveis
para o efetivo cumprimento da ordem.
Tendo em vista que se trata
de procedimento sigiloso, tendo em vista, ainda, que as decisões
proferidas recentemente referentes ao aplicativo Whatsapp causaram certa
indignação da sociedade, a fim de garantir a todos que serão afetados
por este decisum o direito à informação, passo a decidir a questão,
analisando em separado os demais pedidos, a fim de que somente a
presente possa ser de conhecimento público, permanecendo íntegro o
sigilo da presente investigação.
Esta magistrada, no bojo dos
autos da investigação criminal em epígrafe, determinou o cumprimento da
quebra do sigilo e interceptação telemática das mensagens compartilhadas
no aplicativo Whatsapp em relação aos terminais-alvos indicados no
ofício encaminhado pela d. autoridade policial ao Facebook do Brasil,
sob pena de aplicação de multa coercitiva diária no valor de
R$50.000,00, além de eventual configuração de crime de obstrução à
Justiça e suspensão dos serviços até cumprimento da ordem judicial.
Aduz a autoridade policial, após a primeira comunicação, que a empresa
lhe encaminhou email – a partir do remetente Shannon Kontinos,
Shannon@zwillgen.com, - cujo teor foi redigido em inglês e, em suma,
revela que o Whatsapp não copia ou arquiva mensagens compartilhadas
entre seus usuários e ainda formula cinco perguntas sobre a investigação
de onde partiu a determinação para a quebra, sem cumprir a determinação
judicial. Noutra oportunidade, teria informado através de entrevista do
criador do sistema criptográfico utilizado para codificação das
mensagens acerca da impossibilidade da interceptação telemática dos seus
conteúdos.
Ao ofício assinado por esta magistrada, contendo a ordem de quebra e interceptação telemáticas das mensagens do aplicativo Whatsapp, a referida empresa respondeu através de e-mail redigido em inglês, como se esta fosse a língua oficial deste país, em total desprezo às leis nacionais, inclusive porque se trata de empresa que possui estabelecida filial no Brasil e, portanto, sujeita às leis e à língua nacional, tratando o país como uma "republiqueta" com a qual parece estar acostumada a tratar. Duvida esta magistrada que em seu país de origem uma autoridade judicial, ou qualquer outra autoridade, seja tratada com tal deszelo.
Ao ofício assinado por esta magistrada, contendo a ordem de quebra e interceptação telemáticas das mensagens do aplicativo Whatsapp, a referida empresa respondeu através de e-mail redigido em inglês, como se esta fosse a língua oficial deste país, em total desprezo às leis nacionais, inclusive porque se trata de empresa que possui estabelecida filial no Brasil e, portanto, sujeita às leis e à língua nacional, tratando o país como uma "republiqueta" com a qual parece estar acostumada a tratar. Duvida esta magistrada que em seu país de origem uma autoridade judicial, ou qualquer outra autoridade, seja tratada com tal deszelo.
Como se não bastasse, nesta resposta
enviada ao Juízo em inglês, solicita a empresa que o próximo ofício seja
encaminhado na mesma língua e ainda formula perguntas totalmente
improcedentes e impertinentes, vez que se trata de procedimento de cunho
sigiloso, sendo certo que nenhuma destas informações se faz necessária
para o cumprimento ou não da ordem judicial.
"If possible, please provide responses in English as that will significantly improve our ability to analyze and process your request in a timely manner.
1. Is this a criminal matter?
2. What organization is conducting the investigation (Federal Police, Civil Police, Prosecutor's Office)?
3. What is the nature of the crime being investigated (corruption, drug trafficking, gun violence/homicide, child exploitation, terrorism, etc.)?
4. What are the specific WhatsApp accounts that are the target of this legal process (including all applicable country codes)?
5. What data are you requesting for each of the targets listed above?"
Curioso o fato de que o aplicativo do whatsapp funciona plenamente no
BRASIL com enorme número de usuários, sendo que, por óbvio, o mesmo é
utilizado na língua portuguesa, possuindo, inclusive, corretor
ortográfico em português.
Ora, a empresa alega, sempre, que não
cumpre a ordem judicial por impossibilidades técnicas, no entanto quer
ter acesso aos autos e à decisão judicial, tomando ciência dos supostos
crimes investigados, da pessoa dos indiciados e demais detalhes da
investigação.
O Juízo fica curioso em saber como estas
informações auxiliariam os representantes do aplicativo Whatsapp a
efetivar o cumprimento de ordem judicial vez que, segundo esta, o motivo
dos reiterados descumprimentos, repita-se, são puramente técnicos.
Ao acolhermos o pedido do Whatsapp teríamos que admitir que todas as
operadoras de telefonia, provedores e afins, ao receberem ofícios
judiciais para cumprimento de determinada ordem de quebra de sigilo,
tivessem o mesmo direito garantido de acesso à decisão judicial e aos
autos, com conhecimento dos investigados e dos fatos em apuração, isso
em processos sigilosos, determinaria, com certeza, o insucesso de todas
as investigações.
Neste sentido, os representantes do aplicativo
Whatsapp nada fazem para cumprimento efetivo da ordem judicial, sendo
que ordens idênticas já foram determinadas por juízes de diversos
Estados deste País, no entanto, aqueles têm comparecido em Juízo e em
sede policial pretendendo ter acesso aos autos e à decisão judicial (na
forma certificada), em total desrespeito à Justiça, vez que plenamente
cientificados de que se trata de processo sigiloso, em relação ao qual
nem mesmo a serventia judicial tem acesso!!
Deve-se registrar
que o Juízo não solicitou em momento algum o envio de mensagens
pretéritas nem o armazenamento de dados, medidas estas que os
responsáveis alegam não serem passíveis de cumprimento.
Em
verdade, o Juízo requer, apenas, a desabilitação da chave de
criptografia, com a interceptação do fluxo de dados, com o desvio em
tempo real em uma das formas sugeridas pelo MP, além do encaminhamento
das mensagens já recebidas pelo usuário e ainda não criptografadas, ou
seja, as mensagens trocadas deverão ser desviadas em tempo real (na
forma que se dá com a interceptação de conversações telefônicas), antes
de implementada a criptografia.
Não obstante o descumprimento,
esta magistrada determinou que a intimação pessoal do representante
empresa Facebook Brasil sediada em São Paulo, tendo sido recebida por
funcionário que apôs seu nome e função na cópia do ofício. Embora, o
Whatsapp Inc. e o Facebook Brasil, após o recebimento da ordem judicial,
terem se manifestado nos autos através de seus departamentos jurídicos,
a ordem não foi cumprida. Mesmo depois da terceira determinação,
novamente entregue no escritório da citada empresa, não foi acatada a
ordem deste Juízo, em razão do que o descumprimento persiste.
Conforme se extrai dos autos, assim, a ordem judicial não foi cumprida,
apesar de reiterada por três vezes, ensejando, assim, a adoção das
medidas coercitivas determinadas por este Juízo.
A empresa
WhatsApp Inc. (sediada nos EUA), após responder em inglês, se limita a
peticionar apresentando curriculum vitae de um perito que iria comprovar
a incapacidade técnica no cumprimento da decisão judicial, ao passo que
a empresa Facebook Brasil alega que não "há vínculos entre as
empresas", sendo certo que os operadores do Facebook não detém "poderes
sobre o aplicativo".
Seguindo esta linha de raciocínio ambas as
empresas permaneceriam sempre intocáveis, sem jamais se sujeitar às Leis
do País, uma empresa não possui sede no território nacional, a outra
empresa, sediada no País, não tem "poderes" sobre a empresa de seu
próprio conglomerado.
Ambas prosseguem oferecendo seus serviços no BRASIL, explorando atividades amplamente lucrativas, sem que nenhuma delas jamais seja responsabilizada por seus atos. Notória a aquisição bilionária da empresa WhatsApp Inc. pela empresa Facebook, amplamente noticiada por todos os meios de comunicação:
Ambas prosseguem oferecendo seus serviços no BRASIL, explorando atividades amplamente lucrativas, sem que nenhuma delas jamais seja responsabilizada por seus atos. Notória a aquisição bilionária da empresa WhatsApp Inc. pela empresa Facebook, amplamente noticiada por todos os meios de comunicação:
"Facebook finalizou
a aquisição do serviço móvel de mensagens WhatsApp nesta segunda-feira
(6), com o preço final subindo US$ 3 bilhões, para cerca de US$ 22
bilhões, em função do aumento no valor das ações do Facebook nos últimos
meses.
...
A compra, anunciada pelo Facebook em fevereiro e que recentemente recebeu aprovação regulatória na Europa, reforça os valores estratosféricos de startups de rápido crescimento e a disposição de players já estabelecidos, como o Facebook e o Google, de pagar por elas." (G1).
A compra, anunciada pelo Facebook em fevereiro e que recentemente recebeu aprovação regulatória na Europa, reforça os valores estratosféricos de startups de rápido crescimento e a disposição de players já estabelecidos, como o Facebook e o Google, de pagar por elas." (G1).
Como não poderia deixar de ser, a Jurisprudência de
Nossos Tribunais vem se manifestando contrariamente, reconhecendo a
responsabilidade da empresa Facebook Brasil, assim vejamos:
"Considerando que ser fato público e notório que a empresa Facebook
adquiriu o serviço móvel de mensagens "WhatsApp" no ano de 2014 e que
apenas o Facebook possui representação no país, possui este legitimidade
para responder também pelo pedido direcionado àquela empresa"
(70064361157 RS – DES REL RICARDO MOREIRA LINS PASTI -8ª CÂMARA CÌVEL –
TJ RS).
"Autora que pretende, com a presente medida, a exibição
dos IP's dos perfis indicados na inicial e conversas promovidas pelo
aplicativo Whatsapp dos grupos que também indica Deferimento 'Conversas'
que apresentam conteúdo difamatório com relação à autora (inclusive
montagem de fotografias de cunho pornográfico) Alegação da agravante de
que não possui gerência sobre o Whatsapp (que, por seu turno, possui
sede nos EUA) Descabimento Notória a aquisição, pelo FACEBOOK (ora
agravante) do referido aplicativo (que no Brasil, conta com mais de 30
milhões de usuários) Alegação de que o Whatsapp não possui representação
em território nacional não impede o ajuizamento da medida em face do
FACEBOOK (pessoa jurídica que possui representação no país, com registro
na JUCESP e, como já dito, adquiriu o aplicativo referido) Serviço do
Whatsapp amplamente difundido no Brasil Medida que, ademais, se
restringe ao fornecimento dos IP's dos perfis indicados pela autora, bem
como o teor de conversas dos grupos (ATLÉTICA CHORUME e LIXO
MACKENZISTA), no período indicado na inicial e relativos a notícias
envolvendo a autora - Medida passível de cumprimento Obrigatoriedade de
armazenamento dessas informações que decorre do art. 13 da Lei 12.965
/14 Decisão mantida Recurso improvido." (AI 21147742420148260000 – TJ SP
– DES REL DES SALLES ROSSI).
"Agravo de instrumento. Provedor
de aplicativo na internet. Alegação de disseminação, em grupos de
correspondência eletrônica, de montagem de fotografias pornográficas com
a imagem da autora, exposição de seu número de telefone, local de
trabalho e falsa indicação de que dedicada à prostituição. Deferimento
de tutela antecipada para obrigar a ré a fornecer os registros de acesso
dos responsáveis pela transmissão do conteúdo, bem como a removê-lo.
Pretensa distinção entre a pessoa jurídica ré ("Facebook do Brasil") e
quem se diz responsável pelo aplicativo ('Whatsapp Inc.') que não obsta a
concessão da liminar, aparentemente havida fusão entre esta e o grupo
societário estrangeiro a que pertence aquela, bastando, por ora, a
integração da lide pela pessoa jurídica nacional. Precedentes..." (AI
20958433620158260000 – 1ª Câmara Cível – TJ SP).
Cumpre, assim,
ratificar veementemente o fato de que a empresa Facebook Serviços do
Brasil, proprietária do aplicativo Whatsapp, descumpriu uma ordem
emanada de juiz de direito prejudicando o prosseguimento de investigação
criminal que apura a prática de crimes gravíssimos nesta Comarca.
O Novo Código de Processo Civil, no que tange à competência da
autoridade judiciária brasileira, estabelece em seu art. 21 que a pessoa
jurídica estrangeira que tiver agência, filial ou sucursal em nosso
território é considerada domiciliada no Brasil, portanto, estando a
empresa instalada no território nacional, deve obediência à legislação
pátria, inclusive, comunicar-se através da língua oficial do país.
Veja-se que nos termos do art. 1.126 do Código Civil, "é nacional a
sociedade organizada de conformidade com a lei brasileira e que tenha no
país a sede de sua administração".
O Marco Civil da Internet também regula a matéria:
Art. 11. Em qualquer operação de coleta, armazenamento, guarda e
tratamento de registros, de dados pessoais ou de comunicações por
provedores de conexão e de aplicações de internet em que pelo menos um
desses atos ocorra em território nacional, deverão ser obrigatoriamente
respeitados a legislação brasileira e os direitos à privacidade, à
proteção dos dados pessoais e ao sigilo das comunicações privadas e dos
registros.
§ 1º O disposto no caput aplica-se aos dados
coletados em território nacional e ao conteúdo das comunicações, desde
que pelo menos um dos terminais esteja localizado no Brasil.
§
2º O disposto no caput aplica-se mesmo que as atividades sejam
realizadas por pessoa jurídica sediada no exterior, desde que oferte
serviço ao público brasileiro ou pelo menos uma integrante do mesmo
grupo econômico possua estabelecimento no Brasil.
§ 3º Os
provedores de conexão e de aplicações de internet deverão prestar, na
forma da regulamentação, informações que permitam a verificação quanto
ao cumprimento da legislação brasileira referente à coleta, à guarda, ao
armazenamento ou ao tratamento de dados, bem como quanto ao respeito à
privacidade e ao sigilo de comunicações.
Importante trazer à
colação voto do MS n° 2009.04.00.011335-1/PR, da C. 7ª Turma do TRF-4ª
Região, relatado pela Juíza Federal Salise Monteiro, que examinou com
maestria a incidência da lei brasileira em caso semelhante ao examinado:
Inicialmente, mister referir que o artigo 5º do Código Penal Brasileiro
é claro ao estabelecer que se aplica a lei brasileira 'ao crime
cometido no território nacional', havendo inclusive previsão de
incidência, em determinadas hipóteses, ainda quando o delito é praticado
no estrangeiro (art. 7º do Código Penal - Extraterritorialidade). Na
hipótese dos autos, a requisição judicial diz respeito a mensagens
remetidas e/ou enviadas por brasileiro, em território nacional, ou seja,
a investigação se restringe a averiguar condutas praticadas por
brasileiro domiciliado no país, e não de pessoas residentes em outra
localidade, razão pela qual se aplica a legislação pátria, e não as
normas inscritas em qualquer outro Estado estrangeiro.
A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça também já decidiu, conforme voto relator da Ministra Laurita Vaz:
"Não se pode admitir que uma empresa se estabeleça no país, explore o
lucrativo serviço de troca de mensagens por meio da internet - o que lhe
é absolutamente lícito -, mas se esquive de cumprir as leis locais."
Não há, assim, como se tolerar que as autoridades judiciais deste país,
frequentemente à frente de investigações criminais de grande monta,
estejam sujeitas a tamanho descaso. Trata-se de uma afronta ao sistema
judiciário nacional e muito mais do que isso, uma afronta ao próprio
Estado Nacional.
Também não há dúvida da sujeição da empresa
Facebook Brasil às Leis nacionais, não se justificando a desídia da
empresa com as autoridades brasileiras no que concerne ao cumprimento
das ordens judiciais emanadas do Poder Judiciário.
Ora, se as
decisões judiciais não podem efetivamente ser cumpridas e esta
informação é sempre rechaçada por peritos da polícia federal e da
polícia civil que afirmam ser possível o cumprimento, como foi possível
ao Google do Brasil, em determinada ocasião, cumprir as decisões
judicias que até então alegava ser impossível, deveremos então concluir
que o serviço não poderá mais ser prestado, sob pena de privilegiar
inúmeros indivíduos que se utilizam impunemente do aplicativo Whatsapp
para prática de crimes diversos, orquestrar execuções, tramar todos os
tipos de ilícitos, sempre acobertados pelos responsáveis legais do
aplicativo Whatsapp, que insistem em descumprir as decisões judiciais,
tornando estas condutas impossíveis de serem alcançadas pela Justiça.
O aplicativo whatsapp possui mais de 1 (um) bilhão de usuários em todo
mundo, sendo certo que o "BRASIL é o segundo país com maior número de
usuários atrás apenas da África do Sul. Segundo relatório divulgado
pela entidade, 76% dos assinantes móveis no Brasil fazem uso regular do
Whatsapp, que é o comunicador instantâneo mais popular no País".
Como se conclui, não pode um serviço de comunicação de tamanho alcance,
ser oferecido a mais de 100 (cem) milhões de brasileiros sem, no
entanto, se submeter às Leis do País, descumprindo decisões judiciais e
obstruindo investigações criminais em diversas unidades da Federação.
Qualquer empresa que se instale no País fornecendo determinado serviço,
deverá estar apta a cumprir as decisões judiciais que, porventura,
recaiam sobre esta, sob pena de cancelamento do próprio serviço, ainda
mais, quando se trata de atividade que envolve lucros vultosos, não
sendo crível que seus representantes não sejam capazes de se aparelhar
para o devido cumprimento das decisões judiciais.
O
desembargador Cezário Siqueira Neto, do TJSE, ao indeferir liminar
pleiteada pelo Facebook para que o serviço do aplicativo Whatsapp fosse
restabelecido após decisão de suspensão prolatada pelo juiz de Sergipe
Marcel Maia Montalvão nos autos do processo nº 201655000183, apontou a
inércia da empresa no atendimento das ordens judiciais:
"Há de
ressaltar que o aplicativo, mesmo diante de um problema de tal
magnitude, que já se arrasta desde o ano de 2015, e que podia impactar
sobre milhões de usuários como ele mesmo afirma, nunca se sensibilizou
em enviar especialistas para discutir com o magistrado e com as
autoridades policiais interessadas sobre a viabilidade ou não da
execução da medida. Preferiu a inércia, quiçá para causar o caos, e, com
isso, pressionar o Judiciário a concordar com a sua vontade em não se
submeter à legislação brasileira".
Quanto à criptografia das mensagens, vale esclarecer, primeiramente, que o sistema de criptografia utilizado pelo aplicativo é medida que visa à garantia do sigilo das conversações entre os seus usuários, que concede à empresa responsável o status de confiável. Evidentemente, não se questiona o fato de o Facebook zelar pelos seus serviços, preservando a intimidade e privacidade de seus usuários de hackers que infestam o mundo virtual.
Quanto à criptografia das mensagens, vale esclarecer, primeiramente, que o sistema de criptografia utilizado pelo aplicativo é medida que visa à garantia do sigilo das conversações entre os seus usuários, que concede à empresa responsável o status de confiável. Evidentemente, não se questiona o fato de o Facebook zelar pelos seus serviços, preservando a intimidade e privacidade de seus usuários de hackers que infestam o mundo virtual.
Há de se considerar, porém, que a codificação criptografada imposta às
conversações online pelo Whatsapp não pode servir de escudo protetivo
para práticas criminosas que, com absurda frequência, se desenvolvem
através de conversas, trocas de imagens e vídeos compartilhados no
aplicativo.
Nem se deve entender que a quebra do sigilo e
interceptação telemática do aplicativo traria insegurança aos usuários,
uma vez que a decisão judicial é sempre fundamentada, específica e
abarca usuários que estejam praticando crimes dentro do território
nacional. Ora, se assim não fosse, inviável seria a quebra do sigilo de
correspondência, ligações telefônicas ou correios eletrônicos (Gmail,
Yahoo, Hotmail etc), sempre possível em decorrência de ordem judicial,
sendo certo que tais serviços – ou suas empresas – jamais deixaram de
ser confiáveis em virtude da possibilidade legal de quebra.
Nesse sentido, o desembargador Cezário Siqueira Neto, do TJSE, ao
indeferir liminar pleiteada pela Facebook do Brasil nos autos do
processo nº 201655000183:
Em verdade, o direito à privacidade
dos usuários do aplicativo encontra-se em conflito aparente com o
direito à segurança pública e à livre atuação da Polícia Federal e do
Poder Judiciário na apuração de delitos, em favor de toda a sociedade.
Neste primeiro momento, percebo que a impetrante, em verdade, minimiza a
importância da investigação criminal de componentes de organização
criminosa que utilizam o aplicativo em questão, escamoteando a gravidade
do delito supostamente praticado (tráfico interestadual de drogas), sob
a pecha de garantir o direito à intimidade de seus usuários. Ora, o uso
do aplicativo por quem quer que seja e para qualquer fim não pode ser
tolerado sem ressalvas. Deve, sim, sofrer restrição quando atinge outros
direitos constitucionalmente garantidos, como no caso em comento"
Lapidar, novamente, a decisão constante do voto proferido no MS n°
2009.04.00.011335-1/PR, da C. 7ª Turma do TRF-4ª Região, relatado pela
Juíza Federal Salise Monteiro em caso semelhante:
"Nesse norte,
não se mostra razoável a GOOGLE BRASIL beneficiar-se economicamente, em
larga escala, estimulando a utilização de seus produtos (incluindo o
GMAIL) na população brasileira e manter-se infensa à responsabilidade de
combater os ilícitos derivados do mau uso das ferramentas virtuais por
seus usuários, em território nacional. (...) Portanto, não é concebível
que a empresa brasileira se ancore em disposições legais de tutela do
sigilo telemático dos EUA para respaldar, indiretamente, a prática de
delitos que esse Estado está obrigado a reprimir"
Prevê, nesse sentido, a Lei 12965/2014 (Marco Civil da Internet), que é direito do usuário do serviço:
Art. 7º O acesso à internet é essencial ao exercício da cidadania, e ao usuário são assegurados os seguintes direitos:
III - inviolabilidade e sigilo de suas comunicações privadas armazenadas, salvo por ordem judicial;
E o artigo 10º da mesma Lei dispõe sobre a proteção dos registros das comunicações privadas:
Art. 10. A guarda e a disponibilização dos registros de conexão e de
acesso a aplicações de internet de que trata esta Lei, bem como de dados
pessoais e do conteúdo de comunicações privadas, devem atender à
preservação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das
partes direta ou indiretamente envolvidas.
§ 1º O provedor
responsável pela guarda somente será obrigado a disponibilizar os
registros mencionados no caput, de forma autônoma ou associados a dados
pessoais ou a outras informações que possam contribuir para a
identificação do usuário ou do terminal, mediante ordem judicial, na
forma do disposto na Seção IV deste Capítulo, respeitado o disposto no
art. 7º.
Atualmente, e sabedores das dificuldades impostas aos
órgãos de persecução criminal para ter acesso ao teor das conversas,
organizações criminosas e outras súcias desenvolvem intensa comunicação
no referido aplicativo, seja praticando crimes, seja tramando futuros
delitos, além de frustrarem os órgãos de inteligência policiais que
buscam incessantemente informações que visem à elucidação de suas
autorias.
Desta forma se manifestou o n. representante do Ministério Público:
"Não se admite a justificativa da impossibilidade técnica para atender.
A empresa Whatsapp Inc. é uma multinacional que precisa se adequar ao
interesse público, pois os investigados estão deixando de falar ao
telefone o que interessa à investigação, para somente se comunicar pelo
aplicativo".
Neste mesmo sentido, consta dos autos certidão do
agente responsável pela investigação, relatando que em algumas conversas
interceptadas nestes autos: "interlocutores mencionam, àqueles com quem
falavam, mensagens através do aplicativo whatsapp evitando, inclusive,
falar do que se tratava determinada mensagem".
Essa referência
ao aplicativo whatsapp, onde criminosos que estão sendo interceptados
deixam de falar ao telefone e indicam que preferem se comunicar através
do referido aplicativo, são verificadas em diversas investigações, sem
que a Justiça nada possa fazer!
Neste sentido, a finalidade
pública da persecução criminal sempre deverá prevalecer sobre o
interesse privado da empresa em preservar a intimidade e privacidade de
seus usuários, assim como também deverá prevalecer sobre os interesses
desses últimos, sobretudo quando são investigados por praticarem crimes,
uma vez que não há direito ou garantia constitucional em nosso
ordenamento que se repute absoluta.
Sobre o tema já se manifestou o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes:
"A vida em comunidade, com as suas inerentes interações entre pessoas, impede que se atribua valor radical à privacidade".
Emblemático, também, o acórdão do Superior Tribunal de Justiça:
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS-CORPUS. CONDENAÇÃO. PROVA.
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS-CORPUS. CONDENAÇÃO. PROVA.
SIGILO DE COMUNICAÇÕES TELEFÔNICAS. QUEBRA. AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. - A
inviolabilidade das comunicações, embora erigida ao nível de garantia
constitucional (CF, art. 5º, XII), cede espaço quando presente interesse
público superior, como na hipótese de investigação criminal, desde que
autorizada a quebra por decisão judicial. - Habeas-corpus denegado. (HC
14569/SP, Rel. Min. Vicente Leal, 23/04/2001, 6ª Turma STJ).
Assim, embora se diga, no âmbito geral, que a suspensão dos serviços do
aplicativo Whatsapp causa transtorno aos seus milhões de usuários, é
necessário enxergar justamente o oposto, pois as investigações criminais
onde atuam a Polícia Judiciária, o Ministério Público e o Poder
Judiciário, visam atender, justamente, à população como um todo, tão
carente nos dias atuais de uma melhoria na sua qualidade de vida e nos
níveis de insegurança social, onde índices de criminalidade vêm
crescendo assustadoramente, visando uma diminuição na impunidade que
assola nosso País, atendendo, assim, seus reclames por segurança pública
e Justiça.
A falta ou a negativa de informação por parte da
empresa, deixando de atender a uma determinação judicial, impede aos
órgãos de persecução de apurarem os ilícitos e alcançarem os autores dos
crimes praticados, constituindo-se a recusa no fornecimento dos dados
mera estratégia da empresa a fim de procrastinar e até descumprir a
ordem judicial, sob o pálio de impossibilidades técnicas.
O
prejuízo maior, assim, quando o Facebook do Brasil descumpre uma ordem
judicial, é da sociedade, ante a impunidade gerada pela negativa em
fornecer informações que serão fundamentais para a consecução das
investigações e, posteriormente, para robustecer o processo criminal de
provas que sejam úteis à formação da convicção das partes e do juiz.
Aqueles na sociedade que reclamam a simples ausência de um aplicativo,
como se não nos fosse mais possível viver sem tal facilidade, como se
outros similares não pudessem ser utilizados, como se outros meios de
comunicação não existissem, deveriam lembrar que a maior vítima dos
crimes ora investigados é a própria Sociedade, sendo certo que a todo o
momento novas vítimas são feitas e novos crimes são cometidos sem que a
Justiça possa impedir os fatos ou punir os responsáveis.
Ante
todo o exposto, deve-se impor ao senhor representante da empresa
Facebook, assim, as sanções cominadas na decisão descumprida, a fim de
que efetivamente dê atendimento à ordem judicial deste Juízo.
Em
se tratando de inquérito policial que apura suposta prática do delito
de organização criminosa voltada ao cometimento de diversos crimes, a
conduta do senhor representante legal do Facebook Brasil constitui, em
tese, crime previsto no artigo 2º, parágrafo 1º, da Lei 12850/2013.
Isso posto, considerando o descumprimento de ordem judicial emanada deste Juízo, passo a decidir:
1) Oficie-se à Autoridade Policial, com cópias integrais da presente, a
fim de que seja instaurado procedimento contra o senhor representante
legal das empresas Facebook Serviços Online do Brasil Ltda, pela suposta
prática do crime previsto no artigo 2º, parágrafo 1º, da Lei
12850/2013;
2) Determino a imposição de multa diária no valor de
R$50.000,00 (cinquenta mil reais) até o efetivo cumprimento da medida
de interceptação do fluxo de dados do Whatsapp (na forma da decisão em
separado), com fulcro no artigo 139, IV, do Código de Processo Civil c/c
artigo 3º, do Código de Processo Penal. Intime-se para pagamento o
senhor representante legal da empresa Facebook Serviços Online do Brasil
Ltda;
3) Oficie-se à EMBRATEL, ANATEL, bem como a todas as
operadoras de telefonia celular, a fim de que providenciem,
imediatamente, a suspensão do serviço do aplicativo Whatsapp em todas as
operadoras de telefonia, até que a ordem judicial seja efetivamente
cumprida pela empresa Facebook, sob as penas da Lei;
4) As
medidas ora cominadas deverão ser cumpridas pela autoridade policial da
62ª DP ou por agentes especialmente designados pela mesma ou pela Chefia
da Polícia Civil do Rio de Janeiro;
À d. autoridade policial da 62ª DP para cumprimento imediato.
Duque de Caxias, 19 de julho de 2016
DANIELA BARBOSA ASSUMPÇÃO DE SOUZA.
Juíza de Direito."
Juíza de Direito."
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